Meu Amigo Totoro: como produções internacionais me ensinaram a ver que cultura e idioma andam juntos
Já parou para pensar que toda vez que você consome filmes, séries e desenhos animados de fora do Brasil você está consumindo muita cultura também? Claro que o idioma dessas produções e a forma como ele é articulado por diferentes atores, dubladores e vozes originais; com diferentes sotaques e em diferentes contextos, sempre chama nossa atenção. Nos apaixonamos facilmente por diálogos em inglês, por cenas em espanhol, por personagens falando francês, entre tantas outras possibilidades. Mas ao assistirmos tudo isso estamos consumindo simultaneamente o idioma e a cultura daquele país.
Desde criança, sempre fui apaixonada por anime (desenhos produzidos no Japão e que seguem uma linha estética bem característica). Amava as estórias, o design, o desenvolvimento e evolução dos personagens, ouvir o idioma japonês em diversos diálogos distintos. E é claro que eu sempre ia pegando aqui e ali as injeções de cultura japonesa que estas obras colocam em nós, expectadores. Mas quem abriu as portas para que eu mergulhasse em uma cultura estrangeira de vez com certeza foi a animação Meu Amigo Totoro (Tonari no Totoro/Meu Vizinho Totoro, Fantasia – 1988).
Olha, foi paixão à primeira vista. Como citei, eu sempre fui fascinada pelo idioma japonês, amava ouvir cada detalhe e sotaque nos animes e filmes; mas foi com Totoro que pude ter uma noção mais clara de como cultura e idioma nos possibilitam um mundo de descobertas e encantamento. Através desta obra de Hayao Miyazaki, produzida pelo Studio Ghibli, eu pude receber diferentes camadas de cultura estrangeira e me encher de admiração por ela. Em Meu Amigo Totoro, conseguimos enxergar um Japão rural, muito diferente do que muitas vezes é vendido pela mídia em uma visão high tech, atual e Tóquio-centrista; pois mostra o quão peculiar era a vida naquela época para quem vivia no campo.
Esteticamente, temos imersões disto em cenários como escolas, plantações, casas tão antigas que até pareciam abandonadas; e, claro, um contato muito mais direto das crianças que fazem parte da estória com a natureza. Neste enredo, as irmãs Mei e Satsuki, acompanhadas de seu pai, Tatsuo, se mudam para ficarem mais perto de sua mãe, Yasuko, internada em um hospital local. O drama familiar de ter a figura materna da casa internada envolve o período em que as meninas se encontram em uma cidade nova, uma casa antiga e misteriosa, além de aprenderem a lidar com a companhia apenas de seu pai e de Nanny (uma típica ‘’obaa-chan”: modelo estereotipado da avó japonesa, ou senhora que cuida da casa e das crianças).
O que poderia ser um cenário de solidão para as crianças que passam pouco tempo com o pai, devido ao trabalho, e estão longe da mãe, na verdade se transforma completamente a partir do momento em que elas conhecem um ser mágico da floresta, um espírito protetor e com sabedoria imensa. O que acontece a partir desse encontro? Aí você terá que assistir para entender como este filme, uma obra tão antiga, se tornou um fenômeno mundial e até hoje enche lojas do Ghibli no Japão e movimenta compras de objetos personalizados através do E-commerce.
Mas dá para sentir nesse encontro outras etapas de imersão cultural que nos levam diretamente ao Japão: figuras e elementos típicos do Xintoísmo, funcionamento do transporte e da educação na época, respeito máximo às pessoas mais velhas, proximidade e apreço à natureza; entre outras. Para mim, fica a lição: assistir uma produção internacional não nos incentiva apenas a apreciar e aprender outros idiomas, mas nos pega pelo braço em uma viagem a todos os lugares do mundo. Afinal, quem foi que disse que dava para pensar em idiomas e não pensar em cultura junto?